[...] Os contos de João Melo põem em cena relações de personagens masculinas e femininas, no estado adulto mais desapiedado, cruel e sacana que se possa imaginar.
Desmantelam não só as ideias feitas sobre a pós-independência, que outros também trataram, mas sobretudo derruindo sem qualquer centelha de exotismo a instituição familiar e as relações aparentemente livres e igualitárias de homens e mulheres numa nova sociedade, atingindo assim o cerne da célula burguesa. O autor faz isso com uma verve e acutilância de levar o riso às lágrimas, conjugando, como poucos escritores no mundo (digo bem, sem receio), o humor crítico da coisa social, política, sexual, ideológica, com a deliciosa ironia sobre a própria organização narrativa, em jeito pós-moderno inquieto e atrevido de quem lembra constantemente ao leitor que o real nunca entra no texto, mas este pode mudar a realidade de quem lê.
Pires Laranjeira