:: GAIBÉUS
Alves Redol
«O romance Gaibéus foi publicado pela primeira vez em 1939. É o
ponto de partida da obra romanesca de Alves Redol. Mas é também o ponto
de chegada de uma longa reflexão do autor sobre o significado e o papel
da arte, o primeiro edifício do programa de uma literatura nova. Dessa
reflexão de Redol ficou uma série de artigos publicados em jornais de
Vila Franca de Xira, onde vivia — Vida Ribatejana (entre 1927 e
1934) e Mensageiro do Ribatejo (entre 1934 e 1940). De destacar
ainda a conferência sobre arte, proferida em Vila Franca em 1936. Fiel
ao seu ideário, Redol, antes de escrever Gaibéus, realizou um amplo
"trabalho de campo" — deslocou-se repetidas vezes à lezíria, chegou
mesmo a instalar-se no campo para recolher dados sobre o trabalho nos
arrozais. Os seus blocos de apontamentos contêm numerosas indicações
técnicas sobre o cultivo do arroz. As próprias relações familiares lhe
serviram de documento — o pai de Redol era oriundo da região de origem
dos gaibéus. Hoje Gaibéus é comummente aceite como o romance que
marca o aparecimento do neo-realismo em Portugal.
Eis o mundo que
Alves Redol nos apresenta no seu primeiro romance. História da alienação
de uma comunidade de trabalhadores, ficamos a saber até que ponto são
explorados, e até que ponto essa exploração se deve à falta de união com
outras comunidades de jornaleiros. Gaibéus é, assim, o romance
do divórcio entre ganhões, uns procurando resgatar algumas bouças
ou sulcos que ainda lhes pertencem, outros alheios ao que seja possuir
qualquer chalorda ou mesmo canteiro. História simbólica do embate de
duas diferentes mentalidades, a desunião entre gaibéus e rabezanos é
triste e profético paradigma das oposições, ainda hoje bem marcadas,
entre os camponeses dos minifúndios e os dos latifúndios. Redol
acreditava que seria possível o "casamento" entre uns e outros quando
descobrissem que a mesma fome os une. É disso exemplo simbólico a
parábola dos quatro jovens rabezanos e dos três jovens gaibéus.» - Alexandre
Pinheiro Torres